Falsa promessa de emprego gera indenização por danos morais – Leia a íntegra da decisão Mesmo que o processo seletivo não confira certeza de admissão, para a Justiça do Trabalho do Rio Grande do Sul há direito à recomposição do prejuízo causado na fase pré-contratual. A consideração embasa o acórdão da 9ª Turma do TRT-RS, que reformou sentença e condenou uma metalúrgica a indenizar trabalhador que nem chegou a fazer parte do seu quadro de funcionários. O candidato ao emprego passou por todas as etapas do processo seletivo da reclamada para a vaga de retificador. Entregou seu currículo e CTPS, realizou os exames admissionais de praxe, incluindo os de sangue, urina, audiometria e visão, além de ter sido entrevistado pela representante do RH da empresa. O autor afirmou ter assinado um contrato de experiência, o que lhe deu segurança para pedir demissão de seu antigo emprego. Ao chegar na reclamada no dia combinado para iniciar suas atividades, a celebração contratual foi frustrada. O reclamante, presente à palestra de integração, foi chamado, durante a exposição, para uma outra sala onde devolveram sua CTPS informando que ele não mais seria contratado. A Juíza Marilene Sobrosa Friedl, atuante na 1ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul, julgou a ação improcedente, verificando a inexistência de provas e testemunhas que respaldassem o depoimento do reclamante. A magistrada entendeu também que não houve indução ao pedido de demissão do antigo emprego e que, portanto, não há evidência de que tenha havido qualquer agressão, pela ré, a bem psíquico do autor. O relator do recurso, Juiz Convocado Marçal Henri Figueiredo, declarou que mesmo diante da ausência de prova de que as partes firmaram contrato de experiência, é incontroverso que o reclamante participou de um processo seletivo na reclamada, fato que foi confirmado pela preposta da empresa. Sob esse entendimento e reprovando a conduta da reclamada, o colegiado foi unânime em fixar indenização no valor de R$ 6 mil reais por danos morais. Cabe recurso à decisão. Processo 0000318-59.2010.5.04.0401 Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região Acórdão do processo 0000318-59.2010.5.04.0401 (RO) Redator: MARÇAL HENRI DOS SANTOS FIGUEIREDO Participam: JOÃO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA, CLÁUDIO ANTÔNIO CASSOU BARBOSA Data: 18/11/2010 Origem: 1ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul Versão em RTF | Andamentos do processo ——————————————————————————– EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PROMESSA DE EMPREGO. Caso em que a reclamada submeteu o reclamante ao processo de seleção, realizou exames médicos, reteve sua CTPS e o convidou para participar do evento de integração, atos que indicam o ânimo de contratar o trabalhador. Desse modo, a promessa de emprego, ainda que no processo seletivo, fere o princípio da boa-fé, impondo-se a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais. Recurso provido. VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul, sendo recorrente JOSÉ ROBERTO BRAND DE CAMARGO e recorrido VOGES METALURGICA LTDA. Da sentença de improcedência das fls. 61-4, proferida pela Juíza Marilene Sobrosa Friedl, recorre o reclamante. Busca, conforme razões das fls. 68-83, a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, além de honorários advocatícios. Contrarrazões às fls. 87-96. É o relatório. ISTO POSTO: 1. Indenização por danos materiais e morais. Promessa de emprego. Busca o reclamante o deferimento de indenização por danos materiais e morais decorrentes de falsa promessa de emprego. Narra que se candidatou à vaga de retificador na reclamada, passando por todas as etapas do processo seletivo. Diz que entregou seu currículo e CTPS, realizou os exames admissionais de praxe, incluindo os de sangue, urina, audiometria e visão, além de ter sido entrevistado pela Sra. Rachel, representante do RH da reclamada. Refere, ainda, que chegou a assinar um contrato de experiência, o que lhe deu segurança para pedir demissão de seu antigo emprego, na empresa Engatsul Indústria Metalúrgica Ltda. Aduz que, ao chegar na reclamada, no dia combinado para iniciar suas atividades, se dirigiu à palestra de integração; contudo, quando estava começando a exposição, foi chamado para outra sala, onde lhe devolveram sua CTPS e lhe informaram que não seria mais contratado. A reclamada, em contrarrazões, entende que o autor não se desincumbiu do seu ônus probatório, nos termos dos artigos 333, I, do CPC e 818 da CLT. Informa que o reclamante apenas participou de um processo seletivo, juntamente com outros candidatos, o que inclui diversas etapas. Assevera não haver prova alguma de que as partes tenham firmado contrato de experiência, tampouco de que o reclamante tenha sido induzido a pedir demissão de seu antigo emprego. Com razão parcial o reclamante. Em que pese inexistir prova de que as partes firmaram contrato de experiência, é incontroverso que o reclamante participou de um processo seletivo na reclamada, fato confirmado pela preposta da empresa, Rachel Mendes da Silva. Referiu a preposta (fl. 60v.): “[…] que o reclamante passou por um processo seletivo; que nesse processo apresentaram-se vários candidatos; que o reclamante não foi selecionado para a vaga que havia; que esse processo seletivo inclui, para todos, a realização de exames médicos e apresentação de currículo; que o contrato só é assinado após o candidato realizar os exames médicos e passar pelo processo de integração (palestra dada aos candidatos que envolve segurança e informações sobre a empresa reclamada); que quem participa dessa palestra (integração) já foi selecionado e passará a ocupar a vaga na empresa; que o reclamante não participou desse processo de integração”. (grifou-se) O reclamante, por seu turno, à fl. 60, disse que: “no mês de Agosto de 2009 o depoente entregou um currículo na reclamada para o trabalho como retificador (na mecânica); que o trabalho em questão envolvia o turno da noite; que estava aberto um processo de seleção na reclamada; que fez a entrevista no RH com a Srª Raquel; que essa entrevista aconteceu no mesmo dia em que o depoente entregou o currículo; que no mesmo dia foi encaminhado para a realização de exames (hemograma, audiometria, clínico, urina); que os referidos exames foram feitos na Clínica Fátima; que além do depoente havia outras pessoas realizando o processo de seleção e também os exames; que depois da realização dos exames, o depoente os entregou no setor médico da reclamada e foi aprovado pelo médico da demandada; que no dia em que entregou os exames, no setor médico, o depoente entregou sua CTPS no departamento de recursos humanos, para Raquel; que Raquel comunicou ao depoente que estava, ele, contratado no dia em que foram entregues os exames no setor médico e a CTPS a ela (19/08/09); que Raquel comunicou ao depoente que deveria, ele, se apresentar na segunda-feira subsequente ao referido dia 19 para a realização da “integração”; que esse procedimento da “integração” envolve aqueles empregados que já estão contratados e vão iniciar a prestação de trabalho à reclamada; que nessa segunda-feira, encontravam-se numa sala (de treinamento) umas 30 pessoas, entre eles o depoente, e antes de iniciar a palestra uma pessoa veio até essa sala, chamou o depoente e mais umas outras quatro pessoas e comunicou a eles que a vaga destinada a eles não seria ocupada; que, então, foi devolvida a CTPS do depoente a ele bem como para as demais pessoas; que o depoente assinou um contrato de experiência no dia 19/08/09; que esse contrato foi assinado no departamento de recursos humanos; que apenas o pessoal do RH viu o reclamante assinar esse contrato; que as únicas pessoas que viram Raquel comunicar ao depoente que ele estava contratado pela reclamada e que viram ele assinar tal contrato são as pessoas que trabalham no departamento de recursos humanos da reclamada, que lá estavam no momento desses atos”. (grifou-se) Nesse contexto, não é razoável acreditar que a empresa tenha submetido o reclamante ao processo de seleção e à exames médicos, retido sua CTPS e o tenha convidado para participar do evento de integração, sem que esses atos indicassem o ânimo de contratá-lo. Ora, qualquer trabalhador, diante dessa situação, criaria a expectativa de contratação e tomaria as medidas necessárias para assumir seu novo posto, o que, no caso do reclamante, foi o pedido de demissão no seu antigo emprego. Nesse sentido, aliás, é o entendimento deste TRT: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – FASE PRÉ-CONTRATUAL. Ainda que o processo seletivo não confira certeza de admissão, tomando a empresa atitudes que evidenciem de forma inequívoca que o contrato de trabalho caminha para a celebração, frustrada esta, haverá direito à recomposição do prejuízo causado, mesmo na fase pré-contratual. (Processo nº 0021000-69.2009.5.04.0013, relatado pelo Exmo. Desembargador Ricardo Tavares Gehling, publicado em 23/06/2010). Desse modo, a promessa de emprego, ainda que no processo seletivo, fere o princípio da boa-fé. Tal princípio traz ínsito um modelo de atitude, exigindo que as partes ajam de acordo com um padrão moral. Consoante a boa-fé, devem as partes se comportar de forma leal durante toda a relação mantida, gerando deveres e direitos anexos aos principais. Prescinde-se, desse modo, da consciência do agente a respeito de sua conduta. A boa-fé como fundamento da responsabilidade pré-contratual é a objetiva, definida como um padrão de conduta a ser seguido. Devem as partes se comportar com clareza e honestidade durante todo o “iter” contratual. Desse modo, o princípio da boa-fé incide sobre as relações contratuais fazendo surgir um vínculo obrigacional entre as partes, ainda que o contrato sequer se perfectibilize. Portanto, contata-se que a promessa de emprego pela reclamada, indubitavelmente, trouxe prejuízos morais ao reclamante. No ensinamento de Sérgio Cavalieri Filho tem-se a compreensão da desnecessidade de prova, quando se trata de dano moral puro (in programa de responsabilidade civil, 5ª ed., 2ª tiragem, 2004, p. 100): “…por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível exigir que a vitima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais. Nesse ponto a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. (…) Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti que decorre das regras de experiência comum”. Contudo, não há prova do alegado prejuízo material do reclamante. É que não há nenhum documento que comprove as despesas com telefone, luz, água e transporte escolar informadas na inicial, embora presumível. Cumpre, então, a fixação do quantum indenizatório a ser pago pela reclamada em favor do reclamante, a título de reparação pelo dano moral. É sabido que, na quantificação da indenização por dano moral, deve o julgador, valendo-se de seu bom senso prático e adstrito ao caso concreto, arbitrar, pautado nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, um valor justo ao ressarcimento do dano extrapatrimonial. Neste propósito, impõe-se que o magistrado atente às condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, assim como à intensidade e duração do sofrimento, e à reprovação da conduta do agressor, não se olvidando, contudo, que o ressarcimento da lesão ao patrimônio moral deve ser suficiente para recompor os prejuízos suportados, sem importar em enriquecimento sem causa da vítima. Assim, considerando essas diretrizes e a reprovabilidade da conduta da reclamada, que lançou falsas promessas de contratação ao reclamante, entende-se adequada a fixação do valor indenizatório em R$ 6.000,00 (seis mil reais). 2. Honorários advocatícios. A declaração de pobreza feita à fl. 16 garante o acesso ao Judiciário como prevê o inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal. Não se reconhece a prevalência do monopólio sindical para a prestação da assistência judiciária, por se tratar de direito fundamental. A assistência judiciária pode ser concedida com base na Lei 1.060/50 e art. 790, § 3º, da CLT, razão pela qual esta Turma não aplica o entendimento versado nas Súmulas nº 219 e 329 do TST. Aplicação, ainda, da Súmula 450 do STF. Defere-se, assim, honorários advocatícios fixados em 15% do valor bruto da condenação. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados integrantes da 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade de votos, dar provimento parcial ao recurso do reclamante para condenar a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00, além de honorários advocatícios no importe de 15% sobre o valor bruto da condenação. Valor da condenação arbitrado em R$ 6.000,00. Custas de R$ 120,00, pela reclamada. Intimem-se. Porto Alegre, 18 de novembro de 2010 (quinta-feira). JUIZ CONVOCADO MARÇAL HENRI FIGUEIREDO Relator
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